Nunca um tema foi escolhido com tanta acuidade: SURPRESAS. Foi uma Noite recheada de surpresas, desde o acompanhamento musical que falhou mas… surpresa das surpresas, na própria Sessão improvisou-se um agradável dueto que electrizou os presentes.
Mário Jorge, do Executivo da Junta e nosso companheiro da mesa, informou que esta seria a última Noite de Poesia neste Salão Nobre. A próxima Sessão já será no edifício novo da Junta, na Avenida D. Manuel II, a inaugurar ainda neste mês de Outubro.
A Noite de Poesia começou com os pedidos de desculpas e os abraços mandados pelos poetas que não puderam estar presentes, nomeadamente Armindo Cardoso, Jaime Gonçalves, o casal Miguéns, Albino Santos, entre outros.
Maria Mamede e José Gomes leram, no âmbito da Poesia na Net”, os poemas enviados por Lena Maltez, Armindo Cardoso, João Diogo, Jaime Gonçalves, Maria Paula Raposo e Leonor Costa.
Ao dar a notícia que não haveria animação musical, fomos surpreendidos pelo Ferreira da Costa que, apresentando o seu amigo Joaquim Soares, apaixonado pelos instrumentos de corda, disse que poderiam preencher a Noite com algumas interpretações musicais. Foi assim que ouvimos o som do cavaquinho e as vozes destes dois amigos interpretando temas populares, nomeadamente, “Canção do Marinheiro”, “Ponha aqui o seu pezinho”, “Rosinha do Meio” “Lira”… interpretações que foram acompanhadas por uma plateia deliciada e participativa.
Maria Mamede leu o seu “tema”, um poema muito bonito e que faz parte do programa distribuído na Noite de Poesia, seguindo-se os trabalhos poéticos de Ercília Freitas, Teresa Gonçalves, Manuela Carneiro, Inocêncio Vidal, José Gomes, Ferreira da Costa e Maria de Lourdes dos Anjos.
Para ilustração desta primeira parte escolhi este poema da Maria de Lourdes dos Anjos, “feito na hora” e declamado pela própria. Espero que gostem e que eu consiga decifrar esta letra “bonita”:
Surpresa!
Chegou a vida ao final da manhã
num choro de criança
num braçado de esperança
e trouxe um sonho cumprido
Surpresa!
Com um ramo de pampilhos
enfeitei-me de Verão
trauteei uma canção
e, para minha surpresa,
senti-me jovem princesa
Surpresa!
Ouvi agora mesmo
exactamente agora
mesmo, mesmo, nesta hora
para surpresa de todos nós
que a Dignidade vai ter voz
e o mundo sem sangue ou revolta,
vai dar uma enorme volta!
Vamos ser solidários, simples
Verdadeiros e menos desiguais.
Acabaram as guerras, a fome
e outras coisas que tais
e surpresa… surpresa
a mentira matou-se
porque senão… ia presa!
Maria Lourdes dos Anjos
(declamado pela própria)
O Tema Livre começou com a leitura de dois poemas de Fernanda Garcias, seguindo-se as intervenções dos poetas António Castilho Dias, Elisabete Carvalho, Manuela Carneiro, Joaquim Soares, Ercília Freitas (que nos leu um texto do jornalista Paulo Soares, recentemente despedido do Jornal Primeiro de Janeiro, do Porto), José Gomes, Teresa Gonçalves, Inocêncio Vidal, Maria Lourdes Anjos e Ferreira da Costa.
Maria Mamede e José Gomes deram a notícia do falecimento de Fernando Peixoto, poeta, professor, encenador, dramaturgo, escritor, homem do teatro e que frequentou várias vezes estas nossas Noites de Poesia. Foi um amigo comum, um Homem que cativava, um professor que fazia de cada aluno um amigo.
Maria Mamede dedicou-lhe, em 3 de Outubro, data do seu falecimento, este poema:
CARTA A UM AMIGO QUE PARTIU
É outono outra vez!
As folhas mortas cobrem o chão
e um vento, agreste
vem falar de despedidas.
Hoje, vieram dizer-me
que tinhas partido...
será que voaste?!
É outono, outra vez!
E ainda há pouco
tu me falavas em primavera...
sei que o sol está mais fraco
e as andorinhas
já deixaram os nossos beirais;
talvez nalguma delas
tu achasses transporte
ou, quem sabe, andes por aí
feito menino
a brincar com a bola de trapos
ou a jogar ao pião
ou ao arco
na margem do rio
este que amamos
e te viu nascer...
é, decerto voaste!...
E eu tinha tanta, tanta coisa
para te dizer!...
Porém, as palavras, agora
deixaram de ser precisas;
o pensamento basta!
E também sei
que mais logo
quando a noite cair
neste nosso ilusório firmamento
há-de brilhar mais uma estrela!...
Maria Mamede
(Ao querido Amigo Fernando Peixoto)
Coube-me a mim fazer o elogio fúnebre do Fernando Peixoto, acabando por declamar o último poema que me enviara há meses:
"Não, meu amor... Nem todo o corpo é carne" - David Mourão-Ferreira
Não, meu amor, também és fogo
na forma como incendeias os sentidos.
Não, meu amor, também és raiva
onde espojo meu corpo em suor.
Não, meu amor, também és água
a dessedentar minha língua
seca de silêncio e de vómito.
Não, meu amor. Não és apenas carne,
nem apenas caule, nem apenas fruto,
mas sobretudo a seiva
de que se alimenta a minha ânsia de fuga.
Não, meu amor, também és mulher,
a parte que não existe em mim, homem !
"Não, meu amor... Nem todo o corpo é carne".
Às vezes é uma viagem
ao interior uterino da criação
ao Imo da Vida !
Fernando Peixoto
Antes de terminar esta Noite de Poesia, foram feitos os seguintes anúncios:
Ferreira da Costa convidou para as Noites de Poesia em Gondomar, que se realizam no último sábado de cada mês. Universidade Sénior de Gondomar, Largo de Santo António, em Gondomar.
O autor, Albino Santos e a Edium Editores têm o prazer de o convidar para a sessão de lançamento do livro de poesia “Madrugada sem Fronteiras” a ter lugar no Auditório da LIPOR, Baguim do Monte, no próximo dia 11 de Outubro, sábado, pelas 17, 30 horas. (…)
